terça-feira, 30 de março de 2010

O nascimento dos sete pecados (Parte II - Gula e Avareza)

(Wellington Virgolino - Gula)
"Você traz a coca-cola, eu tomo.
Você bota a mesa, eu como, eu como,
Eu como (...) você.

Bota a sobremesa, eu como, eu como,
Eu como (...) você!
"
(Você não entende nada - Caetano Veloso)
 A Gula foi gerada vazia. Um grande vazio que dava dor. Um enorme oco que precisava ser preenchido com coisas e mais coisas, externas. Mas nada que entrava ocupava espaço. Entrava e desaparecia. Entrava e desaparecia. E ela foi primeiro criança. E nessa carência de ocupação do espaço interno foi atrás de doces. Doces, doces, muitos doces. Verdes, vermelhos, amarelos, azuis. Açúcar. Sacas de açúcar para ocupar algum canto, menor que fosse. Mas não ocupou. E cresceu e foi adolescente. E procurou por frituras e gorduras. Óleo amarelo, translúcido, líquido, quente, borbulhante. O cheiro do óleo frito a atraía e ela fritou tudo o que viu. E engoliu, mas também não adiantou. E foi adulta. Procurou por carnes de todos os lugares. Vermelhas e brancas, assadas ou sangrando, ferrosas. Tudo ingeriu e não adiantou. E foi idosa. Deglutiu cremes, pastas, sopas, chás. Mas também não teve efeito. Até hoje ela tenta ocupar seu oco, agora comendo tudo junto. Doce, salgado, azedo, amargo, oleoso, umâmi e água. Até hoje o buraco persiste. Maior que nunca, mais largo que nunca, mais fundo que nunca. E maior continua a sua necessidade. E procriou a Avareza.


(Wellington Virgolino - Avareza)

(Iria ter uma pequena epígrafe aqui também, como todos os demais pecados, mas a o Avareza tomou para si, disse que era só dela e que não iria deixar mais ninguém ver)

A Avareza era diferente. Também possuía dentro de si uma grande caverna sem nada, desocupada, pronta para ser preenchida. Mas o que lá adentrava, ocupava sim um espaço. E ela juntou dentro de si tudo o que tinha e encontrava. Qualquer coisa que podia ser medida, qualquer coisa que podia ser pesada. Mas era melhor aquilo que luzia. O que tinha valor, real ou imaginário. E sua gruta começou a encher. Dentro, começou a lotar. Ela sentiu que quando ficasse abarrotada seria tomada de um êxtase maravilhoso. Mas toda vez que seus conteúdos iam tocar o teto, ele se deslocava para cima. O teto sempre se afastava quando estava perto do total preenchimento. Inexoravelmente se distanciava. Então ela começou a guardar ainda mais dentro de si. Precisava alcançar a plenitude e sentir aquilo, por isso necessitava de mais. Queria tudo e queria mais. Tinha tudo e queria mais. Até que as coisas chegassem no topo que não chegava. E se alguma vez lhe tiravam algo de dentro, o espaço desocupado era o triplo. Não o quádruplo. Não o duodécuplo. Qualquer coisa tirada liberava muito mais espaço do que ocupava e ela desejava aquilo de volta com uma ânsia extremada. Era preciso pegar tudo e ficar com tudo. Assim, veio à luz a Inveja...

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