domingo, 28 de fevereiro de 2010

Das seis horas



O manto da noite caindo lá fora
O sussurro do vento da noite chamando
O portal místico da noite se abrindo
E eu aqui...

Pensando se respondo a seu chamado,
Decido entrar na noite
E nunca mais sair...

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Memórias: labirinto da vida pregressa


(Epitafium - Jacek Yerka)
"Porque o passado me traz uma lembrança do tempo que eu era criança.
(...)
Pela beleza do que aconteceu há minutos atrás."
(Poema - Cazuza)

O mundo das memórias é como um labirinto,
É fácil se perder nesse mundo infindo.

O mundo das memórias às vezes nos engana,
É fácil trocar cenas e ilusões vêm à tona.

O mundo das memórias nem sempre é acessível,
É fácil não encontrar mais o que fora esquecido.

O mundo das memórias às vezes nos saqueia,
É fácil enredar-se em muitas de suas teias.

O mundo das memórias é só bom anfitrião,
É fácil visitar. Mas se viver lá, sairá mais não.

sábado, 20 de fevereiro de 2010

História

O passado está morto e também enterrado,
Espero que nunca mais saia dos meus porta-retratos.

O estrago do meu passado se compara às guerras por ouro,
De longe ainda se pode ouvir o eco dos estouros.

O passado está presente e ainda não se acabou,
Quando passou não poupou nada, levou-me tudo: até o amor.

O passado não é só memórias, nem é só lembranças,
Os pés continuam a doer após os primeiros passos da dança.

O passado ainda corre como sangue sob minhas veias,
E corre fino por entre os dedos como a mais fina das areias.

O passado está vivo e é encontrado em toda parte,
Ainda que avance a tecnologia e a gente se mude para Marte.

E se você me perguntar o que o passado me deixou,
Responderei sem hesitar: saudades, alguma alegria e muita consciência de dor.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Unbelieveble




Príncipe encantado
Princesa adormecida
Felizes para sempre

Fidelidade masculina
Sinceridade feminina
Respeito entre os lados

Amor impossível
Paixão incondicional
Confiança absoluta

Fé inabalável
Ceticismo completo
Tudo o que não existe

Não existe.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Conselho sobre moderação

(A grande onda - Hokusai)


"O que será que me dá?
Que me queima por dentro, será que me dá?
Que me perturba o sono, será que me dá?
Que todos os ardores me vêm atiçar?
Que todos os tremores me vêm agitar?
E todos os suores me vêm encharcar,
E todos os meus nervos estão a rogar,
E todos os meus órgãos estão a clamar,
E uma aflição medonha me faz suplicar."
[O que será (à flor da pele) - Chico Buarque]

Àqueles gostam de emoções fortes
E perdem seu tempo realizando desejos torpes.

Passam seus dias tentando saciar
Ilusões que um dia os chegarão a matar.

Desejo em fúria que angustia,
Falta de paz, revelia:

Muito doce deixa tudo enjoado,
Sal em excesso estraga o assado,

Água demais mata a planta.
Presente seja a temperança!

sábado, 6 de fevereiro de 2010

É tão estranho...

Mataram um estudante. Dois tiros. Na cabeça.

Há alguns anos sua vida era um exemplo. Exibido em rede nacional. Definição de felicidade. A mãe que vê o seu filho, negro, de família humilde, estudante de escola pública passar no vestibular depois de anos de esforços. Ela não podia conter as lágrimas de felicidade.
Hoje, infelizmente, as lágrimas no rosto daquela mãe são de tristeza, dor. Violentaram a vida de seu filho. Ceifaram todos os seus sonhos.

Eu apenas queria ter a certeza que morte dele não será mais um número nas estatísticas.
Eu apenas queria ter a certeza que, um dia, todos os jovens poderão sonhar sem o medo de terem suas vidas e seus planos interrompidos.
Eu apenas queria que a vida valesse.
Eu apenas queria que não fosse em vão...

Fica aqui o meu registro de luto e revolta.

Para Alcides.

Vida finita: Desperdiçada ou Aflita

Pesada,
Medida,
Pensada,
Perdida.
Essa é a vida
De quem não se joga
No caos, nem no nada.
Mas a vida é finita.

Apressada,
Aguerrida,
Suada,
Mordida.
Essa é a vida
De quem se afoga
Na lama profanada.
Mas a vida é finita.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Paradoxo da consciência

 (O último granadeiro de Waterloo - Horace Vernet)
(Como se não fosse suficiente toda a lágrima chorada,
Nem toda a dor sentida,
Nem toda a memória repassada,
Nem toda a existência compartida...)
 “Mas não tem revolta, não. (...) Ter saudade até que é bom, é melhor que caminhar vazio. A esperança é um dom que eu tenho em mim.
(Era uma bricadeira - Caetano Veloso)
Muitas vezes a gente tem uma porção de verdades universais que nem questionamos. Simplesmente sabemos que elas existem. O nosso consciente aceita e pronto. Mas o inconsciente duvida. Talvez “duvida” não seja bem a palavra que melhor se encaixe na situação, mas digamos que ele leve um bom tempo para processar e v-i-s-c-e-r-a-l-i-z-a-r. Foi isso o que aconteceu com aquele garoto.
Ele amava sua parenta, talvez mais do que tudo. Mas sendo ela bem mais velha que ele, era óbvio, ele sabia, que ela iria embora desse mundo provavelmente bem antes dele. Tinha uma certeza racional de que isso iria acontecer. Seria o rumo natural da vida, do tempo, das coisas.
Um dia, chegou essa hora. Ele não sofreu tanto no momento em que ocorreu a perda. Pelo contrário, inesperadamente superou com grande facilidade. Ela tinha passado por um processo tão doloroso antes de sua partida que esse embarque para o outro lado não tinha sido surpresa, então houve para isso um processo de aceitação prévio. Isso era o que ele achava.
Mas depois de um tempo, ele entendeu que não tinha sido assim. O fato é que ele não sofrera tanto não porque ele estava preparado, mas porque ele não tinha percebido de fato o que tinha ocorrido. Ele verificou a real extensão de sua perda bem depois. Depois de meses, ele se deu conta do quanto e do que tinha perdido. Claro que já tinha computado tudo antes: os dias sem ela, as horas sem ela, a vida sem ela. Ele sem ela. Mas sentir todo o peso que isso realmente significava, sentia só a partir daquele momento.
E foi como se toda a lágrima chorada não tivesse sido suficiente.
E foi como se toda a dor sentida não tivesse sido suficiente.
E foi como se toda a memória repassada não tivesse sido suficiente.
E foi como se toda a existência conjunta vivida não tivesse sido suficiente.
E não foi.
Mas só agora a alma tinha se dado conta!
Muitas vezes a gente tem uma porção de verdades universais que nem questionamos. Simplesmente sabemos que elas existem. O nosso consciente aceita e pronto. Mas o inconsciente duvida. Digamos que, na verdade, ele leve um bom tempo para processar e visceralizar. Foi isso o que aconteceu com aquele garoto.